14/07/2011

Os 7 erros de Diniz

Graziella Valenti e Adriana Mattos | De São Paulo

14/07/2011


Os clientes das redes do grupo Pão de Açúcar descobriram, de repente, que são consumidores de uma rede varejista francesa chamada Casino. Esse foi um dos saldos práticos alcançados por Abilio Diniz, fundador do Pão de Açúcar, com a investida que fez a revelia do sócio francês, na tentativa de se juntar ao Carrefour. O empresário jogou um enorme holofote no acordo que fez em 2005, quando combinou de entregar o controle da rede ao Casino em julho de 2012.

Acabou com a imagem arranhada, desgastado e ainda teria que se preparar para um segundo roud, caso a proposta liderada pelo BTG avance.

Na avaliação do mercado, foi uma sucessão de erros cometidos pelo empresário que motivou o fracasso da tentativa de criar uma gigante varejista de R$ 65 bilhões de faturamento - R$ 36 bilhões do Pão de Açúcar e R$ 29 bilhões do Carrefour. Depois de iniciar um projeto desse porte sem o sócio, por iniciativa própria, Diniz teria superestimado sua capacidade de convencimento e subestimado a resistência do Casino.

Além disso, a ideia de colocar o BNDES na transação, que inicialmente serviria como validação do negócio e pressão sobre o Casino, despertou uma grande atenção da opinião pública sobre a operação - e essa postura foi bastante negativa, ao ponto de levar o banco de fomento a recuar e relativizar seu apoio ao negócio.

Não era algo esperado e não havia um plano mais maduro e mais bem desenhado para lidar com essa rejeição tão elevada. Soma-se a tudo isso problemas na estratégia de comunicação do negócio.

Na avaliação de interlocutores, houve uma preocupação muito maior com a engenharia financeira do negócio do que com o plano de exposição, ou de convencimento, de que ele poderia ser algo bom.

O tom adotado pelo Casino, que abriu o debate para um discurso mais emocional e de questionamento ético, tomou conta das discussões. Em determinado momento, chegou-se veicular informações de que Diniz poderia perder muito com o negócio, mas como a operação era muito boa, ele aceitaria perder o que tinha.

Houve ainda dificuldades em conseguir atrair alguma simpatia à operação, enquanto os argumentos do Casino de desrespeito ao contrato conquistaram forte apelo.

Esse apelo, em parte foi obtido porque abriu-se espaço para isso. Quando Diniz disse que Naouri não explicava exatamente porque a proposta era ruim, dias depois o Casino publicou comunicado para mostrar, ponto a ponto, as razões de o projeto ser fora de sentido. Questionavam detalhes da proposta, alguns até então inéditos para o mercado.

Além disso, logo que a proposta de Diniz foi apresentada, há duas semanas, participaram da apresentação o banco BTG Pactual e a Estater Gestão e Finanças, que assessora Diniz. O empresário não participou dessa apresentação, o que acabou passando a impressão de que se tratava de algo criado pelo banco apenas. E era de conhecimento do mercado que Diniz estava na linha de frente do processo.

Não é de hoje que Diniz e seu principal assessor financeiro, Pércio de Souza, sócio da Estáter, conversam com a Blue Capital, maior acionista do Carrefour na França. Os diálogos iniciais datam de 2009, quando surgiram rumores de que o Walmart poderia comprar as operações do Carrefour no Brasil. Na época, Souza procurou o Blue Capital para dizer que eles não deveriam fazer negócio com os ativos brasileiros sem ouvir o que o Pão de Açúcar tinha a oferecer.

Ao longo do tempo, houve encontros esporádicos entre esses acionistas das duas empresas - Pão de Açúcar e Carrefour.

Até que em abril deste ano, Diniz disse ao sócio Jean-Charles Naouri, controlador e presidente do Casino, que queria olhar mais de perto o negócio Carrefour. Na época, Naouri foi categórico ao responder que não havia interesse.

Mas o empresário brasileiro decidiu ir adiante. Acreditava que quando apresentasse o negócio pronto e atrativo, o Casino não resistiria e negociaria. Afinal, não seria o primeiro negócio que começaria com alguns problemas. E o Casino historicamente dava certa liberdade para Abilio começar a negociar estratégias do grupo, pensavam os assessores.

Mesmo sem saber exatamente o que Diniz estava fazendo, as relações começaram a se complicar já naquela época. Quando vinham ao Brasil, os representantes do Casino passaram a se negar a visitar as unidades do Pão de Açúcar e convidavam os executivos para almoços e jantares fora da empresa.

A tensão aumentou conforme as suspeitas de que algo estava sendo desenhado por Diniz cresciam. Até que a negociação vazou na França, justamente no dia em que o empresário brasileiro foi levar, pela primeira vez, o modelo pensado para apresentar à administração do Carrefour. Antes, as conversar eram sempre com os acionistas.

O Casino, então, iniciou sua forte reação, dizendo desde então que não havia espaço para diálogo. Tudo o que queria era o que estava em contrato: o controle do Pão de Açúcar em 2012.

Interlocutores de Diniz contam que esperavam uma reação ruim e até explosiva de Naouri. "Mas ele foi muito mais hábil e obcecado em tentar enterrar o projeto do que se poderia imaginar", afirma um consultor contratado pelo grupo Pão de Açúcar para analisar a proposta.

Com isso, Diniz ainda teve de enfrentar as acusações de que estaria vendendo pela segunda vez algo que já havia entregado em 2005. O negócio surgia, então, como uma forma de o empresário perpetuar-se no controle do Pão de Açúcar.

Logo após o vazamento das negociações - que foram negadas pelo Pão de Açúcar - o Casino iniciou um processo arbitral e comprou ações do Pão de Açúcar no mercado. As iniciativas aceleraram a divulgação do projeto de Diniz.

A investida do grupo francês sobre o mercado para ampliar a participação na varejista poderia prejudicar o balanceamento das equações das participações acionárias no modelo desenhado para a junção com o Carrefour.

A forma como o Casino reagiu ajuda a entender certos erros de Diniz. Em muitos momentos, ele acabou sendo atropelado pelos acontecimentos (pedido arbitral, compra de ações) anunciados pelo Casino - que praticamente todos os dias, desde o anúncio da proposta, veio a público questionar a forma como Abilio agia. Havia uma grande quantidade de informações circulando no mercado sobre o negócio.

A reunião extraordinária entre conselheiros do Casino, na última terça-feira, é um exemplo disso. Logo após a votação contrária ao projeto de Diniz, o Casino já se preparava para entrar com um pedido de antecipação da reunião do conselho de administração de Wilkes, que aconteceria no dia 2 de agosto.

Dessa forma, se após a reunião do conselho e mesmo com a possibilidade de desistência do BNDES, a proposta ainda ficasse de pé, poderiam pressionar por um fim mais rápido. A reunião do conselho de Wilkes seria fundamental porque nela, Naouri e Diniz discutiriam a proposta cara a cara.

Não foi preciso antecipar o encontro porque a proposta de Abilio foi "temporariamente" retirada de discussão.

O negócio que começou como um grande projeto de Diniz, cujas discussões já duram mais de dois anos, terminou na terça-feira com os assessores de Diniz dizendo que "era a hora de jogar uma pá de cal" nesse modelo. Abre-se espaço para pensar em uma nova forma de incluir o Casino num outro desenho de um projeto de fusão. A questão é saber se as partes voltam a sentar e se acertar.

Fonte: Um Investimentos

 


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