20/10/2011

Indignação global

Celso Ming

Por todos os cantos do mundo vão brotando manifestações, passeatas e concentrações. É a Primavera Árabe; a inesperada irrupção da violência em Londres e em Berlim; os acampamentos dos indignados na Espanha; os protestos dos estudantes em Santiago; e agora esse movimento que carrega palavra de ordem: “Ocupe Wall Street”.

Impressionados com a grande capacidade de mobilização proporcionada pela internet e pelas redes sociais de comunicação, observadores parecem mais preocupados em avaliar o poder de transformação dessas agitações coletivas. Querem saber até que ponto conseguem desestabilizar regimes políticos – caso da Primavera Árabe – ou se não passarão de um furacão que logo dará lugar à bonança – como em 1968, sobretudo na França.


Seus desdobramentos nas relações de poder são matéria para analistas políticos e sociólogos. O objetivo desta Coluna é tentar identificar a origem dessas frustrações das classes médias.

Não há um foco aparente que unifique esses eventos. Mas dá para reconhecer uma revolta contra os privilégios dos ricos. É o que leva alguns a julgar essas ações como ataques à excessiva concentração de riqueza.

A má distribuição da renda nacional (e global) não é somente um atentado contra a justiça social. Também provoca enormes distorções na economia e, a longo prazo, é fator de desestabilização política. Mas não dá para caracterizá-la como a principal força propulsora do descontentamento atual. As disparidades na divisão da renda apenas são capazes de grandes mudanças quando vêm acompanhadas de outras motivações.

No Brasil, por exemplo, o acesso desigual a ela é um grave problema social – e um certo conjunto de fatores sugere que não está melhorando como deveria. No entanto, o brasileiro médio de hoje parece satisfeito por carregar a sensação de que progrediu. Mas ele não está comparando seu padrão de vida com o das classes altas, que prosperaram mais do que ele. Está levando em conta apenas sua vida nos anos anteriores.

A generalização dessa percepção tem a ver com três fatores: com o controle da inflação a partir do Plano Real, que deixou de esmerilhar tão fortemente o poder aquisitivo da população; com as políticas de transferência de recursos para os setores menos favorecidos da sociedade; e com o melhor crescimento econômico dos últimos anos.

No resto do mundo, especialmente nos países avançados, as classes médias vivem uma síndrome diferente. O desemprego e a devastação do patrimônio familiar (sobretudo imobiliário), agravados com a crise, são fatores de destruição de projetos de vida. É aquilo que alguns observadores dos Estados Unidos têm chamado de “fim do sonho americano”.

É um fenômeno diretamente ligado à impressionante redivisão mundial do trabalho: transferência dos empregos para a Ásia e incorporação da mulher ocidental ao mercado de trabalho em apenas três gerações. E não se pode minimizar a enorme evolução tecnológica, que está desmontando capacitações profissionais.

A história da humanidade ensina que caldeirões de insatisfação coletiva são frequentemente usados por competentes manipuladores das massas que, em seguida, tratam de aniquilar instituições democráticas. Ou seja, o aprofundamento da crise pode se transformar em caldo de cultura das ditaduras. E este é o risco.

CONFIRA

O avanço do emprego formal em setembro tornou precipitadas as conclusões de que os números de agosto sinalizavam desaceleração. O mercado de trabalho continua aquecido.

Soy contra. O presidente do Grupo Santander, Emilio Botín, fez duro discurso nesta terça-feira direcionado ao FMI e à área do euro, que exigem rápida capitalização dos bancos europeus. Botín condena a indiscriminação e adverte: mantidas as exigências, haverá apagão do crédito e desvalorização dos ativos, porque os bancos terão de vender posições em títulos para fazer capital.

 

 

 

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