21/10/2011

Tamanho não é tudo, mostra a incorporadora Eztec

Como o empresário Ernesto Zarzur e seus filhos transformaram a incorporadora Eztec na empresa mais rentável do setor

 

Ernesto Zarzur (à esq.) e seus filhos Silvio e Flávio: "Aqui, o lucro vem em primeiro lugar"

São Paulo - Aos 77 anos de idade, o empresário paulistano Ernesto Zarzur é do tipo que faz pouca distinção entre negócios e família. Controlador e presidente do conselho de administração da Eztec, incorporadora que, no ano passado, faturou 636 milhões de reais, ele costuma despachar diariamente de sua sala localizada no 2ºandar de um pequeno prédio no bairro do Ibirapuera, na zona sul de São Paulo.

A mesa de 12 lugares está sempre ocupada por filhos, netos e alguns diretores da companhia. O espaço, embora austero — há somente uns poucos livros na estante, quatro telefones fixos na mesa e nenhum computador à vista —, funciona como uma extensão de sua casa.

Às segundas e sextas-feiras, é sua residência que serve de escritório. Nesses dias, cerca de 20 pessoas, entre executivos da Eztec e parentes de Zarzur (13 membros da família trabalham na companhia), participam de um almoço preparado pela mulher do empresário, Esther.

Nas três mesas espalhadas pela sala de jantar, não há lugares marcados, com exceção daquele ocupado pelo patriarca, na cabeceira da maior delas.

Entre um e outro prato típico da culinária libanesa, Zarzur aproveita para cobrar resultados: quer saber dos prazos das obras, critica o custo da construção de um empreendimento e reclama do número insuficiente de operários em um canteiro da empresa.

Terminado o almoço, todos retornam ao escritório para colocar em prática as orientações dadas pelo chefe. A julgar pelo cronograma de lançamentos da Eztec, esse pessoal tem muito trabalho pela frente.

Até o fim do ano, a empresa deve iniciar a construção do maior empreendimento da história do setor imobiliário brasileiro: duas torres comerciais de altíssimo padrão no bairro paulistano da Chácara Santo Antônio, com valor de venda estimado pelo mercado em 1,2 bilhão de reais — 20% mais que o do prédio ocupado pela sede do banco Santander, localizado no Itaim, cuja venda teve o valor mais alto registrado até hoje (oficialmente, a empresa não comenta o assunto).

Apesar de se tratar de um investimento grandioso, não é pelo tamanho que a Eztec tem chamado a atenção de analistas e investidores. Com uma atua­ção restrita ao estado de São Paulo, a empresa ocupa atualmente a modesta 14ª posição entre as maiores incorporadoras do país, com um valor total de lançamentos (ou VGV, no jargão do setor) de 1,2 bilhão de reais previsto para este ano — para efeito de comparação, a PDG, maior do setor, vai lançar entre 9 bilhões e 10 bilhões de reais em 2011. O principal atrativo da Eztec é a rentabilidade. 

No primeiro semestre, a empresa da família Zarzur foi a mais lucrativa do setor, com um resultado de 157 milhões de reais e uma margem líquida de 43%, o índice mais alto entre as incorporadoras. (PDG e Cyrela, por muito tempo as preferidas do mercado financeiro no setor imobiliário, registraram margens de 15% e 6,6%, respectivamente.)

"Em um setor pressionado por custos, a Eztec virou uma máquina de fazer dinheiro", diz Flávio Conde, analista de imóveis do banco Banif. Em tempos de bolsa com resultados desanimadores, a empresa conseguiu o segundo melhor desempenho do setor, atrás apenas da JHSF, que aumentou os dividendos pagos por suas ações.

Enquanto o IMOB11, índice que reúne as principais incorporadoras de capital aberto, caiu 29% de janeiro até agora, os papéis da Eztec desvalorizaram 3,2%.

Criada em 1979 por Zarzur (o "ez" remete ao nome do fundador), a Eztec ainda funciona como uma típica empresa familiar. Zarzur acompanha de perto cada detalhe da operação. Todos os dias, vai aos canteiros para fiscalizar pessoal­mente as 24 obras em andamento.

É dele a palavra final sobre a negociação de preços com fornecedores, compra de terrenos, valor dos imóveis e até peças publicitárias. Por decisão sua, seus quatro filhos e dois genros ocupam os cargos mais estratégicos da companhia. Flávio, o primogênito, é responsável pelo relacionamento com bancos e o mercado.

Silvio, atual presidente da incorporadora, lidera a compra de terrenos e o desenvolvimento de projetos. Marcelo e Marcos cuidam da área de obras e marketing, respectivamente. Os genros ficaram com os departamentos jurídico e administrativo.

Além disso, sete de seus 16 netos trabalham na empresa como engenheiros, advogados e arquitetos. "Enquanto o pai está vivo e com condições de tocar o negócio, os filhos não podem ter autonomia", diz Zarzur. 

 

Estratégia

Filho de imigrantes libaneses de classe média alta, o fundador da Eztec ingressou no mercado imobiliário aos 18 anos como gerente de suprimentos na construtora de seu irmão mais velho, Waldomiro, conhecido por ter erguido o primeiro (e até hoje o mais alto) arranha-céu de São Paulo, o Mirante do Vale, no Vale do Anhangabaú, no centro da cidade.

Mesmo sem ter completado o ensino fundamental, Zarzur decidiu deixar o emprego para abrir o próprio negócio. Chegou a ter uma concessionária de automóveis e uma corretora de imóveis. Paralelamente, começou a investir na incorporação de alguns empreendimentos.

O primeiro deles foi um prédio de 75 apartamentos, inaugurado em 1964. Mas foi somente em 1979, já aos 45 anos de idade, que tomou coragem para criar a Eztec junto com os dois filhos mais velhos, ambos formados em engenharia civil. "Desde o início, fomos cobrados exaustivamente por resultados", diz Flávio. 

Para fazer da Eztec a empresa mais rentável do setor, Zarzur e seus filhos seguem um conjunto de regras próprias. A primeira delas é não tomar dinheiro emprestado. Todos os terrenos são negociados à vista, sem a realização de nenhum tipo de parceria ou permuta, como é de praxe entre as incorporadoras.

"Além de conseguir preços melhores, eles não precisam dividir o lucro do terreno com mais ninguém", diz Conde, do Banif. A segunda: só investir em empreendimentos para a alta renda, que garantem margens de cerca de 40%, o dobro daquelas proporcionadas por projetos populares.

Por fim, os prazos de entrega dos empreendimentos são respeitados pelo simples fato de que atrasos significam obras mais caras. A Eztec é um dos raros casos de incorporadoras no Brasil que não têm obras em atraso, um problema que vem se disseminando conforme os empreendimentos proliferam e a mão de obra escasseia no setor — a Gafisa, uma das maiores incorporadoras do país, foi processada por 250 clientes no primeiro semestre, a maior parte dos casos por não ter entregue imóveis na data prometida. 

A família Zarzur começou a descolar a trajetória da Eztec das demais incorporadoras em 2008, no auge da crise financeira internacional. Até então, o clã havia decidido aplicar os 542 milhões de reais que captara no IPO da empresa, em junho de 2007, em sua expansão pelo país, seguindo o caminho de muitos de seus maiores concorrentes.

Mas a ameaça de desaquecimento da economia fez com que Zarzur e seus filhos reavaliassem sua estratégia. O dilema passou a ser crescer mais rápido ou ganhar mais. "Aqui, o lucro vem em primeiro lugar", diz ele.

Antes de ter certeza de qual seria o impacto da crise por aqui, ele demitiu cerca de 50 funcionários, reduziu a remuneração variá­vel dos executivos em 25% e determinou que a empresa só fizesse negócios nas regiões em que já atuava.

"A Eztec percebeu que a expansão para mercados desconhecidos poderia comprometer seus resultados", diz Flávio Queiroz, analista de imóveis do banco Santander. "Em vez disso, preferiu dar um passo atrás e não entrar na corrida para ver quem seria a maior do país." 

Promoção

Apesar da atual prosperidade, analistas e investidores acreditam que a estratégia empregada pela Eztec até agora dificilmente garantirá a manutenção das margens de lucro em patamares elevados daqui para a frente.

"A alta demanda em São Paulo permitiu que os imóveis fossem vendidos pelo preço cheio, o que proporcionou margens gordas à companhia. Mas esse mercado certamente passará por uma acomodação", diz João Crestana, presidente do Secovi. Uma recente pesquisa realizada pelo próprio sindicato em São Paulo dá uma ideia do que pode estar por vir.

Entre janeiro e junho, houve uma queda de 28% no número de imóveis vendidos na região metropolitana da cidade em comparação ao mesmo período do ano passado — embora os preços tenham subido 8,6%.

O novo cenário não poupou a empresa dos Zarzur. No segundo trimestre, a velocidade das vendas da Eztec, medida por um índice conhecido como VSO (venda sobre oferta), foi de 26% — ante 30% no mesmo período do ano passado.

Para atrair mais interessados, a companhia lançou recentemente uma promoção em que garante aos compradores de 300 imóveis, entre comerciais e residenciais, o pagamento do valor correspondente a um ano de aluguel após a entrega das chaves. A ideia é desovar os estoques de imóveis lançados nos últimos dois anos.

Diante de um mercado cada vez mais difícil na capital, Zarzur já começa a considerar a possibilidade, até pouco tempo atrás veementemente descartada, de visitar alguns terrenos em cidades como Rio de Janeiro e Brasília. "A família está crescendo e a empresa tem de crescer também", diz ele.

 

 

 

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