03/10/2011

A ressaca da Heineken acabou?

 

 

Após uma década sem crescer no Brasil, a cervejaria holandesa Heineken — agora dona da Kaiser — finalmente volta a ganhar mercado. Até onde irá seu fôlego?

Germano Lüders/EXAME.com

 

Chris Barrow, da Heineken: time de expatriados e aproximação com distribuidores da Coca-Cola

 

São Paulo - Embora exista há relativamente pouco tempo, o happy hour dos funcionários da cervejaria holandesa Heineken — a quarta maior do Brasil com faturamento de 2,7 bilhões de reais — já é encarado como tradição na companhia.

Todas as sextas-feiras por volta das 17 horas, as 180 pessoas que trabalham na sede da empresa, na Vila Olímpia, zona sul de São Paulo, se reúnem em um bar montado no 5o andar do prédio. A confraternização, que acontece desde dezembro do ano passado, quando a cervejaria mudou para o novo escritório, nunca havia servido a grandes comemorações — até o último dia 9 de setembro.

Naquela data, o grupo foi convidado pelo presidente da empresa, o sul-africano Chris Barrow, de 52 anos, a fazer um brinde especial. "Hoje temos um ótimo motivo para celebrar", disse Barrow, num português carregado de sotaque. "Após um ano de trabalho duro, conseguimos crescer acima da média de mercado."

Entre janeiro e agosto deste ano, enquanto o mercado de cervejas caía 1,3%, as vendas da Heineken cresceram 5% em comparação ao mesmo período do ano passado.

Com esse desempenho, a empresa, que desde janeiro de 2010 é proprietária das marcas Kaiser, Bavária e Sol graças à aquisição da mexicana Femsa por 7,6 bilhões de dólares, voltou a ganhar participação de mercado no Brasil, chegando a 8,6% do total segundo dados da consultoria AC Nielsen — um avanço de 0,7% em um ano.  

Para a Kaiser, uma companhia que viu sua fatia de mercado cair de 15% para 8% depois de passar pelas mãos de brasileiros, canadenses e mexicanos de 2002 para cá, os números atuais têm um efeito tanto psicológico quanto matemático — cada ponto percentual equivale a 200 milhões de reais em vendas.

"Finalmente temos um grupo com experiência em cerveja tocando a operação", diz Barrow, no comando da subsidiária brasileira há um ano.

Tão logo chegou ao Brasil, Barrow substituiu os principais executivos da gestão Femsa por profissionais egressos de outras operações da Heineken espalhadas pelo mundo — dos oito vice-presidentes, cinco são estrangeiros, a maior parte vinda de mercados nos quais a Heineken é líder ou vice-líder em participação, como Portugal e Itália. 

Uma das etapas mais cruciais do projeto de expansão da Heineken no Brasil ficou a cargo de um desses recém-chegados. O português Nuno Teles, vice-presidente de marketing da subsidiária brasileira, comandou uma equipe de 30 funcionários no mapeamento do mercado nacional de cerveja.

Ao todo, foram entrevistadas 3700 pessoas em 12 cidades do país ao longo de seis meses. O resultado foi um mosaico de 49 microssegmentos de atuação — a estratégia de distribuição mudaria de acordo, por exemplo, com o hábito dos jovens ao beber cerveja ou o sexo do consumidor.

Esses resultados foram entregues ao departamento de inovação da companhia, criado em janeiro deste ano. "O trabalho foi a base para o relançamento da empresa", afirma  Teles. "A partir dele, identificamos quais frentes atacaríamos, com quais marcas de nosso portfólio e com que intensidade."

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A primeira decisão foi dar força a duas marcas de consumo de massa: Kaiser e Bavária. No primeiro semestre deste ano, a Heineken investiu 129 milhões de reais em publicidade, de acordo com a consultoria Ibope Media — um aumento de 55% em relação ao mesmo período de 2010.

Apenas para a Kaiser, foram veiculadas quatro campanhas na TV aberta — as primeiras novidades publicitárias desde 2009. Como cerveja e futebol continuam indissociáveis, a Heineken contratou o técnico da seleção brasileira, Mano Menezes, como garoto-propaganda da Kaiser e passou a patrocinar a Copa Libertadores da América.

No caso da Bavária, os esforços foram concentrados no interior do país. Cidades como Ribeirão Preto, em São Paulo, receberam o patrocínio da marca para rodeios e concursos de música sertaneja.

"A comunicação dessas duas marcas estava desfocada e inconsistente", diz Mariana Stanisci, diretora de marcas da Heineken. Segundo dados da empresa, graças a essas mudanças de estratégia, as vendas de Bavária e Kaiser cresceram 15% e 3,3% em volume, respectivamente, no primeiro semestre deste ano. 

Da porta para fora, Barrow vem colocando em prática um plano para estreitar as relações da Heineken com seus distribuidores, ligados ao sistema Coca-Cola e responsáveis pela criação da empresa na década de 80. Todos os 16 parceiros foram visitados nos últimos­ 12 meses.

A consultoria Bain&Company foi contratada para realizar um projeto piloto de treinamento de vendedores, que têm, em média, 7 minutos para apresentar uma dezena de produtos da Coca-Cola aos varejistas, além das marcas pertencentes à Heineken.

Com isso, espera-se criar uma equipe especial de vendas, dedicada exclusivamente às bebidas alcoólicas. "É bem provável que tenhamos até de mudar algumas rotas para atender melhor a cervejaria", diz um dos distribuidores Coca-Cola.

São avanços iniciais, com resultados ainda modestos. Apesar do crescimento, a Heineken continua a ser a quarta cervejaria do país, posição que a coloca a quilômetros de distância de sua principal concorrente global, a AB Inbev, dona da Ambev. Sua principal marca, a Heineken, faz parte do mercado premium, equivalente a cerca de 5% das vendas totais de cerveja no Brasil.

A participação da marca no mercado total, segundo dados de 2010 da consultoria Euromonitor, é quase irrelevante: 0,2%. Recentemente, a competição para a Heineken ficou mais dura, com o lançamento no país da Budweiser, produto mundial da AB Inbev, posicionado como premium no mercado brasileiro.

A situação da Kaiser, cerveja mais popular e de maior volume da Heineken, não é muito mais confortável. A marca tem apenas 6% de mercado e sofre uma forte rejeição no Rio de Janeiro e em alguns estados do Nordeste.

"Se a companhia depender só da marca Heineken, será muito difícil conquistar um espaço relevante", diz Danny Claro, professor de gestão de marketing do Insper. Sem contar com nenhuma outra grande cervejaria à venda — os holandeses perderam a disputa da Schincariol para os japoneses da Kirin em agosto deste ano —, o caminho da Heineken no Brasil promete ser longo e árduo.

 

 

 

 

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