23/11/2011

Juros futuros perdem Selic de um dígito

Por Fernando Travaglini

Mesmo com a leve queda de ontem, o dólar manteve o patamar de R$ 1,8 e a tendência, a depender do agravamento da crise, deve ser de mais apreciação da moeda americana. A valorização acumulada em novembro já chega a 6% e alguns especialistas acreditam que esse poderia ser até mesmo um novo piso para a divisa no curto prazo.

A puxada recente da moeda é gradual, diferente do que ocorreu em setembro, quando houve de fato um "overshooting" - há dois meses, a valorização frente ao real, no mesmo período, foi de 19%, três vezes superior ao ritmo atual.

Mas a alta só não foi maior porque foi compensada pelo fluxo de dólar para o país, que continua abundante, mesmo com a crise. Seja pelo investimento estrangeiro direto, novamente surpreendendo positivamente, seja por captações de recursos por empresas e fundos brasileiros no exterior, o fluxo de recursos está relativamente elevado.

Câmbio e inflação voltam ao radar dos investidores

Os bancos têm monitorado a expectativa de entrada de dólar e a sinalização é que mais divisa entre até o fim do mês. Um indicador dessa expectativa é a queda do chamado cupom cambial - diferença entre os juros internos e externos, em dólar. Não fosse pela entrada de divisas, a moeda já poderia estar na casa de R$ 1,84, acredita Italo dos Santos, gerente da mesa de dólar da corretora Icap.

O atual movimento de fortalecimento do dólar já levanta especulações sobre o impacto na inflação doméstica. Os economistas afirmam que o mais preocupante é sempre uma depreciação permanente na taxa de câmbio. Os coeficientes de contaminação do câmbio para a inflação (conhecido como "pass-through") giram em torno de 7% a 10%, mas é preciso que seja um enfraquecimento mais duradouro da moeda.

O efeito do repique de setembro, por exemplo, quando o câmbio bateu em R$ 1,96, já se dissipou, segundo avaliação de especialistas, pois a moeda recuou em outubro. Mas uma nova elevação, agora sobre uma taxa mais apreciada, poderia novamente trazer problemas para a dinâmica dos preços na economia brasileira.

Hoje pela manhã será conhecido o IPCA-15, prévia da inflação oficial referente ao mês de novembro. As previsões indicam uma alta de 0,47%, ou seja, uma aceleração sobre o número do mês passado (0,42%) - mas que ainda levaria a taxa acumulada em doze meses para baixo, em 6,7%, vindo de 7,12% em outubro.

Uma coisa é clara: a preocupação com a inflação voltou a rondar as mesas de operações de bancos e corretoras. E parte da alta dos juros futuros de prazos mais longos, que ocorreu nos pregões de segunda-feira e terça-feira, é explicada justamente por essa avaliação.

A consequência é que o nível de juros de um dígito, esperado para o próximo ano, ficou para trás. Os contratos de DI negociados na BM&F, com vencimento em janeiro de 2013, fecharam ontem em alta de 0,03 ponto percentual, em 10,01% ao ano.

Isso explica parte da aceleração recente dos juros futuros. Mas há ainda um componente ligado diretamente à crise. Os investidores estrangeiros aproveitaram o momento para desmontar posições especulativas, depois de registrar ganhos consideráveis com a queda dos juros mais longos ocorrida na primeira quinzena do mês, e repatriar parte dos ganhos em meio à elevação da aversão ao risco global vista nos últimos dias.

O contrato de janeiro de 2013, por exemplo, estava indicando uma taxa de 10,48% há um mês. Mesmo descontando o custo de carregamento da aplicação, o investidor que entrou nesse dia ganhou algo como 40 a 45 pontos básicos, lucro importante para esse mercado.

A mudança de posição ganha um reforço baseada na certeza, cada vez maior, de um corte de 0,5 ponto percentual na próxima reunião do Copom, da próxima semana. A cada novo discurso das autoridades do Banco Central (BC), como ocorreu ontem, fica claro que o "ajuste moderado" será mantido no último encontro do ano.

Completa o quadro uma incerteza ligada ao segundo trimestre de 2012 no Brasil. De fato nos próximos meses o fluxo de informações será favorável ao BC. A inflação seguirá convergindo para algo na casa dos 5,5% até abril, como prega o presidente da autoridade monetária, Alexandre Tombini. Mas a partir daí, começam a se acumular os efeitos positivos para a economia, como o reajuste do salário mínimo, o IPI do cigarro e também os impactos do atual ciclo de afrouxamento monetário.

A atividade, portanto, começará a se recuperar, mas ninguém pode prever qual será o ritmo de expansão, dada a crise externa, longe do fim. Ontem, o Federal Reserve exigiu que os grandes bancos americanos façam testes de estresse para avaliar os impactos de uma severa recessão na zona do euro e uma taxa de desemprego nos Estados Unidos de 13%.

Fernando Travaglini é repórter

E-mail fernando.travaglini@valor.com.br

 

 

 

 

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