03/11/2011

A surpresa grega

Celso Ming

A decisão do primeiro-ministro da Grécia, George Papandreou, de convocar referendo popular para validar (ou não) o pacote de salvação aprovado na cúpula da área do euro, dia 27, mostra como são precárias as condições políticas do bloco. O que foi arduamente negociado pode não servir para nada.

Há o tempo da política, o tempo da economia e o tempo dos mercados. Mesmo quando tudo vai bem, nem sempre são sincronizados. Mas na crise são sempre desencontrados e produzem um tranco após o outro.


 

Papandreou precisa de apoio para governar, porque 60% da população rejeita o programa de austeridade negociado em troca do socorro. Mas, se for mesmo convocado, o referendo suspenderá a vigência do principal que, agora, pode não acontecer. Nem todas as decisões tomadas na cúpula do euro diziam respeito à Grécia. A necessidade de elevar o alcance do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (EFSF), por exemplo, fica ainda mais reforçada.

A realização do referendo não é certa. Há indicações de que o Congresso da Grécia pode rejeitá-lo. Nesse caso, as condições de sobrevivência política de Papandreou diminuirão e novas eleições poderão ser marcadas. Mesmo assim, ficaria a incógnita do tratamento político que um novo governo daria ao pacote de socorro.

Se o referendo for mantido e os eleitores não aceitarem o arranjo proposto, não obrigatoriamente a Grécia teria de sair da zona do euro. Essa posição seria entendida como recusa do plano de austeridade e imposição de novas condições (mais transferências) pela Grécia aos sócios da União Monetária. E seria preciso saber se os outros 16 países-membros do bloco se disporiam a bancar mais ajuda aos gregos e a troco de quê.

Independentemente disso, seria improvável que essa votação acontecesse antes de janeiro e, enquanto isso, mergulhada em mais incerteza, a economia europeia poderá encolher ainda mais.

Alguns analistas têm argumentado que o abandono da área do euro pela Grécia sairia caro para os gregos mas, ainda assim, ficaria mais barato do que continuar nas atuais condições.

Essa é uma conta difícil de fazer. O problema é que um calote maior do que 50%, como o acertado na semana passada, deixaria credores em situação ainda mais complicada e exigiria mais reforço de capital dos bancos. Além disso, fora do clube a Grécia não poderia mais esperar por ajuda externa.

A reintrodução da dracma, por sua vez, exigiria forte desvalorização em relação ao euro, para que salários de trabalhadores gregos se desvalorizassem em euros e custos de produção caíssem e facilitassem a recuperação da atividade econômica e do emprego. Uma das consequências seria o aumento da inflação na Grécia.

Do ponto de vista da área do euro, mais essa surpresa dos gregos demonstra como é frágil a sustentação da União Monetária, sem união fiscal e sem um mínimo de coesão política.

Caso se mantenha a convocação do referendo, a provável deterioração da economia pelo aumento do tempo de espera aumentaria o risco de que ocorra uma série desordenada de suspensão de pagamentos (defaults) por parte de Portugal, Irlanda, Itália e Espanha. O acordo do dia 27 mostrou que, em havendo vontade política, é possível agilizar respostas. Mas fica cada vez mais inevitável que o Banco Central Europeu seja chamado para apagar incêndios com emissão de moeda.

O gráfico acima mostra o comportamento da indústria. Retração de 2% em setembro, em relação a agosto, e avanço de apenas 1,1% no acumulado do ano (até setembro, inclusive) e de 1,6% em 12 meses.

A força das exportações. Os resultados do comércio exterior continuam robustos. Apesar da crise externa, as exportações seguem crescendo mais de 30% (em 12 meses), enquanto as importações avançam menos, 25,9% no mesmo período. A tendência para todo o ano é de que as receitas com exportações ultrapassem os US$ 260 bilhões.

 

 

 

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