03/10/2011

Fraude no UBS revela fragilidade dos bancos

 

Irregularidades já levaram instituições a decretar falência; na maioria dos casos fraudes foram cometidas por operadores

BARRY RITHOLTZ , THE WASHINGTON POST - O Estado de S.Paulo

Em 1995, o operador de derivativos Nick Leeson, do Barings Bank, realizou negócios especulativos "não autorizados". As perdas - £ 827 milhões - provocaram a falência do Barings, o mais antigo banco de investimentos da Grã-Bretanha.

Em 1996, outro trapaceiro, o operador de cobre Yasuo Hamanaka, do Sumitomo Bank, perdeu pelo menos US$ 1,8 bilhão. Há quem fale em US$ 4 bilhões. Então, em 2008, Jerome Kerviel, da Société Générale, perdeu 4,9 bilhões de euros - cerca de US$ 6,8 bilhões. Na semana passada, o UBS sofreu um golpe de US$ 2,3 bilhões supostamente por obra de mais um operador desonesto. Como a história nos ensina, não existem operadores trapaceiros; só bancos trapaceiros.

E há uma notícia de última hora: se você emite crédito, deve supor que existem pessoas não qualificadas que tentarão emprestar dinheiro de você. É tarefa de toda instituição de crédito separar todos os dias o tomador qualificado, que tem capacidade para pagar o serviço daquela dívida, do tomador não qualificado.

É por isso que não existe um tomador predatório - os bancos devem pressupor que todos os tomadores são predatórios e se protegerem. É por isso que as instituições de crédito - pelo menos antes de 2002 - investigavam renda, histórico de emprego, capacidade de crédito, outras dívidas, antes de conceder um empréstimo hipotecário.

Do mesmo modo, se sua empresa envolve o emprego de capital emprestado para que seus funcionários possam especular, então caberá a você saber qual deles não é competente.

É um simples fato matemático que alguns dos seus operadores tenham prejuízos; em alguns casos, prejuízos enormes. Sua tarefa será identificar essas pessoas e transferi-las para outras funções.

Cabe a você separar os qualificados dos não qualificados, observar os operadores e especuladores que você emprega. Para tanto, terá de estabelecer limitações às operações, restrições ao endividamento, parâmetros de risco. Os operadores precisam permanecer dentro dos limites que você impuser: money lines, redução máximas do volume de reservas, limites dos prejuízos.

Portanto, as empresas que costumam alavancar o seu capital para colocá-lo nas mãos de uns milhares de funcionários especuladores têm uma tarefa crucial: elas precisam garantir que o capital seja administrado de maneira precisa e competente. Precisam garantir que os níveis de risco sejam toleráveis, que sejam implantados controles adequados, que seus sistemas de TI e sua tecnologia interna tenham condições de acompanhar o que está ocorrendo em tempo real.

Os bancos têm supostamente competência para preservar o seu capital e administrar o risco. Se não puderem cumprir essas obrigações, talvez não devessem operar na área de finanças. Não deveriam adotar um comportamento que coloque em risco o dinheiro dos contribuintes.

Nesse contexto, como é que praticamente a cada ano surge um operador trapaceiro? A resposta é simples: um operador trapaceiro que provoca enormes prejuízos é sinal de fracasso total da administração do banco.

O UBS foi incapaz de acompanhar o destino do seu capital tempestivamente, porque o seu operador londrino ocultou prejuízos durante mais de três anos. A prisão de um trapaceiro deste calibre é um sinal vermelho.

A descoberta da fraude significa que a companhia admite que está sendo mal administrada. O conselho de direção deveria fazer com que a alta administração fosse responsabilizada pelos prejuízos tanto quanto o operador.

Compreenda o que isso significa no contexto mais amplo das fraquezas não tão inocentes do nosso setor financeiro: toda empresa que contrata "robôs" para decidir a concessão do crédito é tão incompetente quando uma empresa que tem operadores trapaceiros. Ambas as práticas são uma acusação, uma admissão de fracasso e de incompetência administrativa.

Cada ato ilegal representa um fracasso crucial da administração de risco, de obediência às leis, da capacidade de exercer as próprias funções de maneira segura e dentro da lei. Numa era de operações de ajuda que oneram indevidamente os contribuintes, esse ato aponta para uma realidade: as empresas devem decidir se vão sacrificar o lucro em busca de segurança, ou sacrificar a segurança na busca do lucro.

O que quer que decidam, não é responsabilidade nem obrigação dos contribuintes apoiar estas escolhas. Paul Volcker, considerado o maior banqueiro central da história, afirmou que as operações em carteira própria não deveriam ser uma função do setor bancário que conta com seguro público.

As operações de ajuda criaram um risco moral, no qual especuladores alavancados e banqueiros trapaceiros sabem que o Estado correrá em sua ajuda. Isto é inaceitável. Não há nenhum motivo para os contribuintes serem considerados responsáveis por estes bandidos, sejam eles operadores ou banqueiros.

Talvez o fato de o UBS não ter conseguido impedir isso nos tenha feito um favor. E ressalta que Volcker está certo: toda empresa que entra em colapso por esse motivo não deveria ter direito a garantias fornecidas pelos contribuintes. As instituições de crédito, subscritores e originadores de hipotecas operam usando o próprio capital para obter um retorno seguro. O seguro respaldado pelo governo deveria estar disponível somente para bancos de depósito, e não para empresas associadas a operadores que se dedicam à especulação. / TRADUÇÃO ANNA CAPOVILLA

 

 

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