14/10/2011

Multimercados, a revanche

Por Angelo Pavini | De São Paulo

Em setembro, um grande número de fundos multimercados conseguiu ganhos expressivos, tanto com moedas quanto com a queda dos juros e das bolsas no Brasil e no exterior. Estudo feito pela Economática com 163 carteiras não exclusivas e patrimônio acima de R$ 100 milhões mostra 20 fundos com ganho acima de 2% no mês, mais que o dobro do CDI, de 0,94%. Do total, 96 superam o CDI.

Setembro turbinou os resultados de muitos multimercados, que vinham apanhando ao longo do ano e viraram o jogo no mês passado. Olhando os melhores em 2011, há dez fundos com ganho superior a 12%, ou o projetado pela Selic para o ano todo. E 89 batiam o CDI no período, de 8,70%.

A maioria dos vencedores tem uma coisa em comum: o pessimismo com a situação internacional. Essa visão levou a apostas na alta do dólar e na queda das bolsas e dos juros no Brasil e no exterior. Muitos carregaram essas apostas desde o ano passado, sofrendo com o baixo retorno e enfrentando a ira dos investidores, até que os cenários se confirmaram e o ganho veio.

É o caso da FRAM Capital, gestora independente cujo fundo Amundsen - homenagem ao navegador norueguês que chegou ao Pólo Sul em 1911 - ganou 4,15% em setembro. Segundo o sócio e gestor Roberto Serra, a casa, que tem R$ 400 milhões sob gestão, já trabalhava com um cenário pessimista desde o início da crise na Europa, em 2010. "Mas a piora veio mesmo em agosto, detonada pela crise do teto da dívida dos EUA", explica.

Havia expectativa que o impacto dessa crise externa atingiria o mercado brasileiro via alta do dólar, o que se confirmou. "Mas acertar o momento de reversão da tendência do mercado era difícil, pois havia um fluxo cambial perene para o Brasil, não havia pressa do especulador em sair", afirma Serra, lembrando que é caro apostar contra o real pelo elevado juro local. "Imagine carregar uma aposta dessas desde o início do ano com o dólar caindo e deixando de ganhar o juro de 12% ao ano."

Assim, o fundo foi feliz em acertar a alta de 18% do dólar em setembro. "Foi um movimento tático importante, ganhamos e reduzimos as aplicações", afirma. A gestora entrou no dólar a R$ 1,65 e saiu quando o BC voltou a intervir no mercado, com a cotação perto de R$ 2,00.

A atuação do BC aumentou a volatilidade do mercado, diz Serra. E o gestor precisa tentar capturar movimentos de curtíssimo prazo. "Achamos que a tendência ainda é de piora, mas não podemos apostar contra uma intervenção do governo", diz.

Nos juros, que também deram ganhos para a FRAM, Serra acha que o BC vai continuar cortando a taxa básica Selic. "E pode cortar mais que o 0,5 ponto que a maioria do mercado espera", diz o gestor, que não se surpreenderia com uma redução de 0,75 ponto na próxima reunião. No dólar, a expectativa é de que haja um alívio e o especulador volte para o Brasil, derrubando o dólar para R$ 1,75. "Mas não dá para prever o que vai acontecer na Europa, e é perigoso ficar otimista."

Outra casa com desempenho excepcional em setembro é a SDA, cujo fundo Absoluto rendeu 4,02% no mês passado. Fundada em 2000 e com R$ 200 milhões sob gestão, a SDA tem sua gestão baseada em operações com derivativos. "Está no nosso DNA", diz o sócio Felipe Teatini.

Isso faz a gestora se sair bem em ambientes mais tumultuados. "Esse mercado de forte volatilidade dos últimos quatro meses é o mais propício para nós, pois fazemos arbitragens e ganhamos com as fortes oscilações", explica Teatini, acrescentando que foi assim também em 2006 e 2008.

Desde inicio do ano a gestora montou operações para aproveitar a desaceleração mundial, basicamente com apostas na queda dos juros, diz o sócio Guilherme Schiller. "Sofremos no começo do ano, até que o mercado percebeu que a situação lá fora ia piorar muito e o BC ia mudar a cabeça com relação aos juros."

O fundo usou opções - operação em que se compra o direito de comprar ou vender determinado ativo a um certo preço no futuro - de juros, apostando na baixa, mas com risco reduzido. "A avalancagem era grande, aplicamos 0,5% do fundo no corte de juros e, se ela desse certo, ganharíamos dez vezes mais", afirma Schiller. Se desse errado, o fundo perderia 0,5% apenas, ou seja, o valor pago pelas opções. Em setembro, porém, veio um corte maior e as opções dispararam.

Segundo Teatini, a SDA continua pessimista e aplicou 0,30% do fundo Absoluto em operações que preveem duas quedas de 1 ponto percentual da Selic nas próximas reuniões. "Se isso se confirmar, ganharemos o dobro de cada ajuste". Se vier 0,5 ponto, o fundo perde 0,30%. Essa é a proposta da SDA, procurar aproveitar os cenários e buscar alavancar as apostas, com boas relações de risco e retorno, diz Carlos Frederico Mello, responsável pela estratégia de renda fixa da casa.

Para isso, normalmente é preciso ficar fora do consenso. "Isso nos leva a sofrer em muitas ocasiões de mercado mais calmo, mas ganhamos comprando seguros baratos, que dão retornos elevados quando o mercado muda", diz Mello. "Tanto que recuperamos agora boa parte do ganho do ano, com juros e câmbio."

No caso dos dois fundos do BTG Pactual com bons retornos em setembro, o grande destaque foi o ganho com juros, diz João Scandiuzzi, estrategista-chefe da área de asset management. "Ambos seguem as mesmas estratégias, nossa visão é por mercado, não por fundo", explica. O High Yield tem posições renda fixa e cambio e o Hedge em renda fixa, câmbio, bolsa e em um fundo hedge no exterior gerido pelas mesas do BTG Pactual.

Até o fim de julho, os fundos seguiam o CDI, com apostas que o BC iria reduzir os juros pela piora do cenário global. "Como achávamos que o juro podia parar de subir ou até cair, fizemos apostas tanto em DI futuro quanto em juros reais, via compra de NTN-B, que chegaram a pagar 7% acima da inflação do IPCA", diz.

Com a queda dos juros, os ganhos dos fundos dispararam. Agora, os fundos reduziram as apostas, mas Scandiuzzi vê ainda ganhos com juros, especialmente nas taxas de médio prazo pela possibilidade de um corte maior. "Mas isso vai depender da situação do mercado internacional."

No BNY Mellon ARX Hedge Plus, o ganho veio do dólar, explica José Tovar, responsável pela asset. "Antecipamos a piora do cenário mundial e a aversão maior ao risco e montamos operações estruturadas de opções de compra de dólar", explica ele. As posições foram montadas pouco antes da crise, diz, e foram sendo roladas à medida que a moeda subia. "A rapidez na rolagem das opções aumentou nosso ganho", afirma Tovar.

Hoje, os fundos desmontaram as posições em dólar. "Vemos o mercado sem direção certa, existem sinais de solução para a crise na Europa e, se isso acontecer, a percepção de piora desaparece", diz. Mesmo assim, ainda resta o desaquecimento nos EUA. "Mas o governo e o banco central americano podem ajudar, e alguns números recentes da economia vieram um pouco melhores."

Para Tovar, não dá para dizer que a crise terminou, "mas dá para ver uma luz no fim do túnel."

 

 

 

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