Esse é o valor que estatal teria deixado de ganhar com a gasolina e o diesel em oito anos por não acompanhar os preços do mercado
RENÉE PEREIRA - O Estado de S.Paulo
A Petrobrás deixou de ganhar R$ 9 bilhões nos últimos oito anos por causa da defasagem dos preços da gasolina e do diesel em relação às cotações do mercado internacional. O valor é resultado de ganhos de R$ 27 bilhões menos prejuízos de R$ 36 bilhões com os produtos no período, conforme cálculos do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).
"Quando o preço do petróleo sobe muito, a Petrobrás subsidia o custo no mercado interno; quando cai, quem subsidia é o consumidor e o acionista", afirma o diretor do CBIE, Adriano Pires.
Neste ano, a defasagem de preços está em 30%, apesar dos preços dos petróleo terem recuado um pouco em relação ao primeiro semestre. O problema é que a Petrobrás está sendo obrigada a importar mais combustível para compensar a redução da mistura de álcool anidro na gasolina. Segundo Pires, em 2010, a estatal comprava no mercado externo cerca de 7 mil barris de gasolina por dia. Naquele ano, a média subiu para 30 mil barris.
Na prática, os gastos da estatal vão subir quatro vezes em relação a 2010, para US$ 1,4 bilhão. "Para piorar, ela vai vender essa gasolina R$ 0,30 mais barata do que no mercado externo", diz o diretor do CBIE. Ele conta que havia uma expectativa de que essa defasagem pudesse ser eliminada com algum reajuste de preços neste semestre. Há alguns meses, um diretor da estatal confirmou que havia uma negociação com o governo para permitir um reajuste.
Mas esses planos foram por água abaixo por causa dos níveis de inflação. No mês passado, o governo decidiu reduzir o valor da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), de R$ 0,23 para R$ 0,19 por litro, para evitar que houvesse um aumento de preço na bomba por causa da redução de etanol na gasolina.
"Hoje não existe nenhuma expectativa de alta dos preços da Petrobrás. Tínhamos a esperança de que a Cide pudesse ser usada para calibrar a defasagem, mas ela foi usada para compensar a redução do álcool", afirma o analista de petróleo da Banif, Oswaldo Telles.
Segundo ele, essa política de represamento de preços da estatal - fortemente influenciada por decisões do governo federal - não é sustentável por muito tempo. A empresa, diz ele, tem perdido entre R$ 50 milhões e R$ 60 milhões por dia por causa dessa postura.
Na opinião dos especialistas, embora o consumidor se sinta beneficiado por essa política no curto prazo, a defasagem traz consequências sérias para a estatal, que tem um ambicioso plano de investimentos para tirar o pré-sal do papel.
Mesmo para os padrões da gigante petroleira, R$ 9 bilhões é muito representativo (é quase o lucro trimestral da companhia), afirma o sócio da gestora, Maurício Pedrosa. "Quem tem de combater a inflação é o BC (Banco Central), não a Petrobrás."
Segundo ele, a defasagem de preços e a política intervencionista do governo federal explicam o desempenho ruim das ações da empresa nos últimos anos, que corresponde a 70% do valor patrimonial (o preço está menor que o lançando nos balanços). "Para o acionista existe falta de transparência na política da companhia. O custo de oportunidade de uma petroleira é o preço do petróleo. Quem compra uma ação (muitos acionistas adquiriram papéis da companhia com dinheiro do FGTS) espera ganhar com isso."
Política. A interferência política na Petrobrás já foi admitida até mesmo pelo presidente da empresa, José Sérgio Gabrielli, em entrevista recente ao Estado. Mas ele trata o assunto com naturalidade e diz que ingerência política ocorre com todas as companhias.
Não é a percepção dos analistas de mercado. Eles acreditam que o resultado da empresa no terceiro trimestre será afetado pela defasagem de preços, o que já ocorreu no primeiro trimestre com a área de abastecimento.
"O excesso de Estado é muito ruim. A companhia poderia dar resultados muito melhores", diz o analista da Ativa Investimentos, Ricardo Correa. Na avaliação dele, a política da Petrobrás também tem reflexo em outras áreas, como a ambiental.
"Por causa da proteção da gasolina, há um déficit da produção de etanol no Brasil." Outro aspecto, completa Correa, é a elevada carga tributária sobre os combustíveis.
Segundo dados de mercado, o preço da gasolina é composto de R$ 0,19 de Cide e R$ 0,26 de Pis e Cofins, o que dá algo em torno de R$ 1,50 o litro.
Sobre esse valor, são acrescidos o custo do etanol anidro, a margem do posto de combustível, a logística da distribuidora e o ICMS. No final, o preço da gasolina sai em torno de R$ 2,50. Ou seja, quase 60% do valor é controlado pelo governo.
"Hoje quem pensa em Petrobrás tem em mente a ingerência política. O pior é que falta um catalisador de curto prazo. Não tem nada grandioso no curto prazo", avalia Oswaldo Telles, da Banif.
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