30/08/2011

7 previsões furadas sobre a bolsa

Uma olhada sobre o que se previa para 2011 no final de 2010 mostra que mesmo os profissionais mais experientes do mercado financeiro estavam otimistas demais

 

São Paulo – O ano de 2011 pegou muitos analistas e profissionais do mercado financeiro experientes no contrapé. O que inicialmente era visto como um período de recuperação após um 2010 em que a bolsa brasileira ficou quase no zero a zero agora já caminha para ser algo frustrante mesmo para quem já não esperava muito. No final do ano passado, a corretora mais cética em relação ao desempenho do mercado acionário, a Fator, previa que o Ibovespa terminaria este ano em 75.000 pontos. Considerando o atual patamar de cerca de 55.000 pontos, o índice terá de registrar uma valorização de 36% até dezembro para que a previsão seja atingida.

O otimista pode estar pensando que muita água ainda vai rolar até o último dia do ano e que a bolsa pode recuperar a maior parte das perdas. É verdade. Mas o que dizer das estimativas mais empolgadas dos analistas? No final de 2010, em um exercício hipotético sobre até onde o Ibovespa poderia chegar, o banco JPMorgan divulgou uma previsão de que o índice atingiria os 122.000 pontos caso uma série de acontecimentos positivos se materializasse. Ainda que a instituição tenha feito a ressalva de que essa não era a hipótese mais provável e que em seu cenário conservador a bolsa alcançaria 84.500 pontos, passa pela cabeça a imagem de um chute mais próximo da bandeira do escanteio do que do gol.

Mas por que analistas que chegam a ganhar mais de 1 milhão de dólares em um ano positivo se equivocam dessa maneira? Por trás de qualquer estimativa tão furada está o que mercado costuma chamar de “cisne negro”. O termo, cunhado pelo ex-operador e professor Nassim Nicholas Taleb, costuma ser usado para lembrar que nenhum ser humano é capaz de prever o que nos espera no futuro – de mutações genéticas de cisnes a atentados terroristas ou quedas nas bolsas.

Outro economista renomado que já tentou explicar os erros dos analistas foi o ex-presidente do Banco Central e sócio da Rio Bravo Investimentos, Gustavo Franco. No livro “Cartas a um Jovem Economista” (clique aqui e leia trechos), ele afirmou que tanto os economistas quanto os meteorologistas sofrem enorme pressão para prever o futuro – uma atividade sempre suscetível ao erro. Na conclusão, no entanto, Franco faz uma defesa da própria classe. “Na gestão de investimentos, sempre haverá profissionais que vão errar e que vão acertar as previsões. Mas quem faz o dever de casa e levanta mais informações que os outros terá uma taxa de acerto acima da média. Da mesma forma, o meteorologista que se graduou em física será melhor que o camarada que ficou na praia, não estudou nada, não passou no vestibular e joga búzios para saber se vai chover ou não.”

Leia abaixo e nas próximas páginas outras seis previsões furadas dos analistas para este ano:

1 – A economia americana vai se recuperar rapidamente - e isso vai ajudar a Bovespa

Essa parece ter sido a mãe de todos os erros nas previsões dos analistas. No final do ano passado, alguns dados divulgados sobre a economia americana sinalizavam que o pior da crise já havia ficado para trás e que as chances de um “double dip” (ou uma nova recessão) eram remotas. Ledo engano. Os números positivos da economia americana em 2010 parecem ter sido mais influenciados por estímulos econômicos artificiais (como a desvalorização do dólar e o aumento dos gastos públicos) do que propriamente pela elevação dos investimentos e contratações das empresas, pela retomada do mercado imobiliário ou pela reação do consumo.


Em entrevista a EXAME.com publicada há duas semanas, Bob Baur, economista-chefe da Principal Global Investors, um fundo de 270 bilhões de dólares, afirmou que, em 2010, pela primeira vez os EUA saíram de uma recessão por meio do aumento das exportações – e não com o aumento das vendas de casas e carros gerado a partir da queda dos juros (clique aqui e leia). É justamente por esse motivo que o mercado desconfia que uma recuperação firme ainda não esteja a caminho.

2 - As ações dos bancos estão baratas

 

As cotações dos quatro maiores bancos brasileiros (Banco do Brasil, Santander, Itaú e Bradesco) estão cerca de 35% abaixo das máximas atingidas nos últimos 12 meses. No começo de 2011, quando as perdas era bem menores que as atuais, 11 em cada 10 analistas de mercado já recomendavam os papéis do setor como um dos investimentos mais atrativos no país. Os especialistas costumavam justificar a preferência com o fato de que esses bancos já haviam comprovado a capacidade de lucrar em qualquer cenário econômico e com a expectativa de que eles fossem menos prejudicados pela alta dos juros do que empresas de varejo ou incorporadoras.

O que parece ter passado despercebido por boa parte dos analistas é que o setor bancário mundial enfrenta problemas graves que tiveram um impacto negativo sobre o preço dos papéis ao redor do planeta. Sempre que um país tem dificuldade para pagar suas dívidas, os bancos são os principais prejudicados porque estão entre os maiores credores. Hoje a confiança nos bancos europeus é tão pequena que boa parte dos países da região proibiu que investidores fiquem “vendidos” em ações do setor financeiro (ou seja, que tentem lucrar com a baixa desses papéis).

Nos EUA, a confiança nos bancos também não é grande. Após rumores de que seria comprado pelo JPMorgan, o Bank of America, um dos maiores bancos do país, conseguiu fechar um acordo com o bilionário Warren Buffett para a injeção de 5 bilhões de dólares em capital. Outro sinal da desconfiança é que os títulos do Tesouro americano com vencimento em três meses pagam zero de retorno aos investidores. Por incrível que pareça, é isso mesmo: zero de retorno. Quem aplica nesses papéis não está atrás de rentabilidade - só não quer deixar o próprio dinheiro depositado em uma instituição financeira. Por mais que o sistema financeiro brasileiro passe por um momento completamente diferente, é difícil imaginar que as ações dos grandes bancos subam bem mais que o Ibovespa enquanto a confiança no sistema financeiro mundial não for retomada.

3 - A Petrobras vai subir após a capitalização

No último trimestre do ano passado, a Petrobras captou quase 120 bilhões de reais na maior oferta de ações da história. Os investidores que colocaram essa montanha de dinheiro na empresa obviamente não esperavam sair perdendo - mas foi exatamente isso que aconteceu. Após registrarem uma das maiores quedas do Ibovespa em 2010, os papéis acumulam uma desvalorização de 22% neste ano.

Em primeiro lugar, é importante explicar os motivos para o otimismo inicial. No final do ano passado, a Petrobras parecia ser a empresa com maior capacidade de ampliação de reservas do mundo devido às descobertas no pré-sal. O fato de a empresa estar capitalizada e com recursos para investir também pesava a favor. Com o início dos distúrbios na Líbia, as ações chegaram a ser cotadas bem acima do valor definido no aumento de capital.

Os problemas começaram logo a seguir. Os preços do petróleo subiram, mas a empresa nem sequer sinalizou a possibilidade de elevar os preços dos combustíveis internamente. Com a inflação acima da meta no Brasil, um reajuste ainda parece pouco provável no curto prazo. Além disso, a empresa corriqueiramente não cumpre as promessas feitas ao mercado. A produção de petróleo em julho foi a menor desde outubro. Os investimentos que estão sendo feitos só devem começar a elevar representativamente a produção a partir de 2013. Até lá, o dinheiro deve continuar saindo do caixa da Petrobras sem que a distribuição de dividendos aumente significativamente.

4 - A China vai manter os preços das commodities em alta

No médio prazo, não existe valorização do Ibovespa sem aumento dos preços das commodities. A Vale, a Petrobras, a OGX e as siderúrgicas são responsáveis por cerca da metade da oscilação do índice. Se as commodities não sobem, portanto, fica mais difícil para o investidor brasileiro ganhar dinheiro.

No final do ano passado, a maioria dos analistas enxergava uma tendência de alta para as commodities. O Federal Reserve mantinha uma política de injeção de liquidez no mercado que favorecia os preços. A China continuava a crescer a passos largos. Os Estados Unidos pareciam cada vez mais distantes da ameaça de recessão. Foi só recentemente que caiu que a ficha do mercado que alguns países da Europa são insolventes e precisarão reestruturar suas dívidas e que os EUA estão em uma situação bem menos confortável do que parecia.

É verdade que a queda das commodities nas últimas semanas foi bem menos intensa que a das bolsas. Se o Fed anunciar um novo programa de injeção de liquidez no mercado, os preços de metais e do petróleo devem tomar novo ímpeto. Mas não se engane: ninguém mais fala em um barril de petróleo a 200 dólares como em 2005, quando o analista Arjun Murti, do Goldman Sachs, virou celebridade ao divulgar essa profecia. Se você comprou as ações da Petrobras ou das siderúrgicas no começo de 2008, portanto, pode demorar em recuperar tudo o que já perdeu.

5 - A OGX é a grande promessa da bolsa

Em meados do ano passado, a OGX se tornou a principal queridinha dos analistas e investidores brasileiros. Pouco menos de dois anos após a estreia na bolsa, a empresa de petróleo do bilionário Eike Batista podia se gabar por porssuir a terceira ação mais negociada da Bovespa e oir valer mais que gigantes seculares e lucrativos como o Banco do Brasil.

Quando anunciou no final do ano passado que adiaria a venda de parte dos blocos da bacia de Campos, a OGX desagradou o mercado. A maioria dos analistas, entretanto, ainda recomendava a compra agressiva dos papéis. À época cotadas a cerca de 20 reais, as ações tinham um preço-justo avaliado em mais de 30 reais e ofereciam uma excelente oportunidade de compra, de acordo com diversas corretoras.

E qual é a cotação atual? Cerca de 11 reais. De lá para cá, a empresa divulgou um polêmico relatório em que a consultoria D&M deixou claro que a exploração de suas reservas demoraria mais do que boa parte do mercado gostaria. A OGX respondeu que tinha o maior índice de acerto em perfurações de poços de petróleo no mundo e que começaria em breve a produzir (clique aqui e leia). No mercado, entretanto, ficou a percepção de que investir em uma empresa de petróleo em um estágio pré-operacional era mais arriscado do que parecia – ainda mais em tempos de turbulência mundial.

6 - A Hypermarcas é uma infalível máquina de aquisições

Os ventos pareciam soprar a favor da Hypermarcas até o final do ano passado. A empresa atuava como uma máquina de aquisições que prometia se transformar em breve em uma espécie de “Unilever brasileira”. Com o caixa levantado com ofertas de ações, a companhia estava bem-posicionada para ganhar cada vez mais escala e engolir rivais da área de bens de consumo e medicamentos.

O sinal amarelo acendeu no mercado em dezembro, quando a Hypermarcas comprou a Mantecorp por 2,5 bilhões de reais. Alguns analistas até consideraram o valor alto demais, mas a maioria continuou a recomendar a compra das ações da empresa. Muitas corretoras mantinham preços-alvo para as ações acima de 30 reais. Hoje os papéis valem cerca de 12,50 reais, e o preço-justo médio atribuído pelos analistas alcança apenas 17,50 reais.

Mas o que fez com que os analistas mudassem de opinião desse jeito? O balanço do primeiro semestre, que levou a uma queda dos papéis de 30% apenas em maio. O documento mostrou que a digestão de muitas aquisições levou a um aumento maior que o esperado nos custos operacionais e nos estoques da companhia, o que teve um efeito negativo sobre as margens. A Hypermarcas reagiu, anunciou a divisão da empresa em duas unidades, melhorou a comunicação com analistas e fez um esforço para divulgar melhor seu potencial. Até agora, o resultado não apareceu no mercado.

É lógico que as mesmas corretoras que erraram em todas as previsões acima também acertaram em outras ocasiões. Afinal, nenhum profissional ganha mais de 1 milhão de dólares por ano só chutando bolas para fora. Mas um relatório publicado pelo banco de investimentos Merrill Lynch em 2008 parece ser bastante esclarecedor sobre a forma correta de ler os relatórios dos analistas. Nele, o estrategista-chefe de investimentos, Richard Bernstein, afirma que quando os analistas estão mais pessimistas, há grandes oportunidades na bolsa, e vice-versa (clique aqui e veja). Seria difícil imaginar um mea-culpa mais explícito.

 

 

 

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