30/09/2011

O poder da classe C

Por Jacilio Saraiva | Para o Valor, de São Paulo

Pequenas e médias empresas redefinem preços e redesenham mercadorias para atender a classe C. De acordo com especialistas em marketing e finanças ouvidos pelo Valor, setores como capacitação profissional, alimentação, comércio e informática têm as mais chances de aproveitar o filão, que ganhou maior poder de compra graças a políticas públicas de distribuição de renda, como o Bolsa Família, à expansão do crédito e do emprego.

Pela primeira vez, a camada social que abrange mais de 90 milhões de pessoas corresponde a quase metade da população brasileira. Segundo dados da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), são consumidores com renda mensal familiar de R$ 1 mil a R$ 4 mil.

De olho nesse público, além de criar novas linhas de produtos, os empreendedores de menor porte querem expandir atividades em pequenas cidades e polos econômicos regionais. Segundo pesquisa da consultoria Data Popular, especializada em baixa renda, três de cada dez pessoas que entraram na nova classe média estão no Nordeste.

Para Henrique Santos, planejador estratégico da agência de publicidade Rae,MP, que atende shoppings populares, as pequenas marcas podem tornar-se as preferidas da classe C, pela boa relação custo-benefício. "Mas um dos grandes desafios é conquistar o público feminino. 56% das mulheres desse extrato da população sonham em consumir roupas e acessórios de grifes conhecidas."

Na Touch Watches, rede de lojas de relógios populares com tíquete médio de venda de R$ 145, 75% dos produtos são destinados à classe C. "Esses compradores sempre estiveram no nosso foco", diz Bruno Lattari, dono de sete quiosques em São Paulo. No ano passado, o empresário faturou R$ 1,5 milhão e a previsão para 2011 é chegar a R$ 2,8 milhões de faturamento. "Metade dos negócios deve ser obtida com os novos clientes", prevê.

Para atrair mais consumidores, a marca desenvolve produtos para o público infanto-juvenil e uma linha de óculos de sol. No próximo ano, além de quiosques, Lattari deseja abrir as primeiras lojas no cobiçado setor de shopping centers.

Na visão de Rodrigo Geammal, diretor da Elos Cross, agência especializada em marketing de resultados, a receita de sucesso no setor emergente não se limita a conseguir oferecer preços baixos. "O preço não é o único fator de decisão de compra da população de baixa renda", avisa. "As pessoas desejam ser percebidas e pertencer a uma segmentação com características próprias. Assim, o mercado precisa entender as novas demandas e bolar estratégias que encantem o comprador."

Na Vallor Urbano, de venda de loteamentos residenciais, a meta é expandir contratos para as regiões Norte e Nordeste do país, em cidades com aproximadamente 100 mil habitantes ou em centros regionais que vivem fase de crescimento econômico. Até 2017, a organização, que faturou R$ 20 milhões em 2010, pretende lançar cinco mil unidades, anualmente.

"Cerca de 85% das receitas em 2011 virão da classe C", afirma Sérgio Guimarães Pereira Júnior, diretor da Vallor Urbano, que vende terrenos a partir de R$ 27 mil. "Os 15% restantes do faturamento total serão do segmento B, oriundo da nova classe média."

De acordo com Luiz Felizardo Barroso, consultor do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Estado do Rio de Janeiro (Sebrae-RJ) e presidente da Cobrart, de recuperação de ativos financeiros, os empresários interessados em explorar o arranque econômico da nova classe média precisam ter cautela nas formas de pagamento oferecidas.

"O prazo das prestações não pode ser muito dilatado e, mesmo assim, é preciso cercar-se de garantias", aconselha. Barroso afirma que há tendência de diminuição da inadimplência no setor. "A facilidade de obtenção de novos empréstimos levou à liquidação de outros financiamentos em atraso."

Em São José do Rio Preto (SP), a Finnance, companhia de 15 funcionários que trabalha com empréstimos pessoais, viu a participação da classe C nos negócios passar de 70% para 80%, nos últimos dois anos. "São clientes que utilizam todo o crédito que é oferecido, com operações de R$ 1 mil a R$ 5 mil", explica a diretora Gláucia Gallo Pereira, que pretende investir R$ 500 mil em 2012, com a abertura de franquias da empresa e um cartão de crédito próprio.

Também fundada no interior paulista, a Dr. Vedação, rede de franquias especializada em produtos de baixo custo para a construção civil, também faz planos de ampliação geográfica, impulsionados pela nova corrente de compradores.

Com duas lojas, em São Paulo e em Minas Gerais, a empresa criada no ano passado tem um portfólio de 400 itens, entre impermeabilizantes, ferramentas e selantes. "No próximo ano, a previsão é chegar a 20 unidades em funcionamento", diz o gerente de expansão da rede, Paulo Pedrini.

 

 

 

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