30/09/2011

Assis vê turbulência externa afetando as aplicações brasileiras

 

Autor(es): Angelo Pavini | De São Paulo

Valor Econômico - 30/09/2011

 

 

A crise na Europa está longe de acabar e vai continuar infernizando a vida dos investidores brasileiros, que terão ainda de lidar com inflação mais alta e juros reais menores. O aviso é do economista e ex-diretor do Banco Central, Luís Eduardo Assis. Para ele, o risco vai continuar elevado no mercado. "O momento não é fácil nem para gestores especializados, que dirá para os amadores", diz.

Para Assis, a aprovação pela Alemanha da ampliação do fundo europeu ontem evitou o caos, mas já não é mais suficiente para resolver os problemas da região. "Temos um excesso de endividamento dos governos e falta de capital nos bancos, o que não é uma situação inédita, há mecanismos para lidar com isso", observa. "Mas tudo esbarra nas dificuldades políticas", diz. Segundo Assis, os problemas econômicos europeus são locais, mas as soluções têm de ser internacionais, e não há mecanismos políticos.

Para ele, a crise terá de chegar a um ponto de gravidade tão grande que todos aceitarão politicamente o custo do socorro à Grécia, que não vai escapar de um calote. "O metalúrgico alemão vai ter de aceitar que vai pagar para socorrer o taxista grego ou a coisa vai ser pior para ele também." Por isso, Assis diz que é preciso tirar o caráter moralista da negociação. "Não podemos levar isso como a história da formiga alemã que poupou enquanto a cigarra grega ficou se endividando."

Para ele, é preciso montar um sistema que isole Itália e Espanha dos efeitos do calote grego, fortalecendo o capital dos bancos europeus e organizando a renegociação da dívida grega.

O problema é que o consenso demora e não há muito tempo. As medidas tomadas pelo governo grego, de cortes de despesas, reduzem ainda mais a atividade e a capacidade de o país pagar a dívida. "Tanto que os papéis da dívida da Grécia já pagam 100% em seis meses, o seja, já embutem um calote", diz Assis. E alguns bancos europeus só não quebraram porque não marcam esses papéis a mercado.

Para o investidor brasileiro, Assis não vê muitas alternativas. O dólar mudou de nível, e essa mudança vai perdurar. Ao mesmo tempo, o governo brasileiro tomou uma atitude mais agressiva ao preferir inflação mais alta a um crescimento menor. "Nosso risco é de inflação maior, não de recessão", diz. O resultado será juros reais menores. "Acabou aquela coisa de quando o mercado piorava todos corriam para o CDI com ganho de 6% reais ao ano", diz.

Para Assis, o Brasil está relativamente isolado da crise, dependente fundamentalmente do consumo interno. Ele acha que a bolsa está barata, mas é um risco alto e pode ficar mais, de acordo com a crise externa. "Não é hora de dar grandes tacadas ou fazer grandes mudanças", diz. Mas aconselha escolher ações de algumas empresas saudáveis, boas pagadoras de dividendos, voltadas para o mercado interno e que tenham sua receita corrigida por índices de preços. "A economia vai continuar crescendo e elas estarão protegidas da inflação", diz.

Ele sugere também papéis de renda fixa de empresas de boa qualidade, corrigidos por índices de preços, já que os juros dos títulos do governo, as NTN-B, já caíram bastante. "Para ganhar um pouco mais será preciso correr risco de crédito e diversificar."

Assis diz que está na "ponta preocupada" do mercado com relação à inflação, por conta do câmbio. Segundo ele, nos últimos dois anos, com dólar baixo, aumentou muito a participação de importados na produção brasileira, e uma alta da moeda terá impactos difíceis de avaliar nos preços industriais locais. "Os modelos econométricos não pegam esse novo cenário", diz. Além do dólar, há também os preços de serviços, que continuarão pressionados pela renda em alta. "Mas o governo só vai reverter sua posição se a inflação subir muito", diz.

 

 

 

 

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