01/08/2011

Gafisa corre contra o tempo

 

Gafisa corre contra o tempo

A mal digerida compra da Tenda e os atrasos na entrega de imóveis levaram a construtora a despencar na bolsa e tornar-se campeã de reclamações na Justiça. Como mudar isso?

Por Rosenildo Gomes Ferreira

Para os adeptos da cabala e de outras crenças que misturam religião e ciência, o número oito representa prosperidade e renovação. Pode se tratar apenas de uma coincidência, mas a diretoria da construtora paulista Gafisa, cuja receita somou R$ 3,7 bilhões em 2010,  escolheu exatamente o dia 8 de agosto para apresentar ao mercado financeiro seus números  referentes ao segundo trimestre do ano. Trata-se de um momento especial para a direção da empresa: o encontro é visto como o marco zero da virada da companhia, que, desde dezembro do ano passado, perdera a condição de uma das queridinhas do pregão da bolsa de valores de São Paulo. 

 

Rapidamente transformada em  patinho feio do mercado, a construtora viu seus papéis desabarem 39,4%,  no acumulado de 2011. Trata-se da maior queda entre as empresas do setor. Mais: a Gafisa também passou a figurar no topo da lista de ações judiciais contra as empresas do setor, movidas por clientes insatisfeitos com o atraso na entrega de seus imóveis. “O segundo semestre deverá ser melhor”, disse à DINHEIRO Alceu Duílio Calciolari, o recém-empossado presidente da Gafisa. “Tanto em relação às margens de operação, quanto na geração de caixa.” Segundo ele, essa perspectiva já foi passada aos analistas, junto com uma prévia dos números que serão anunciados no dia 8. Um deles é o crescimento de 170% nos lançamentos, de abril a junho, em relação ao primeiro trimestre, totalizando vendas de  R$ 1,38 bilhão.  

 

 

"Os problemas da Tenda eram maiores do que imaginávamos"

Alceu Calciolari, presidente da Gafisa

 

Na avaliação de Erick Scott, analista do setor de construção da corretora SLW, a melhora do humor em relação à construtora depende de sua capacidade em apresentar números mais vistosos. “Os investidores começaram a abandonar as ações da Gafisa no final do ano passado, quando ficou claro que seu desempenho financeiro iria se deteriorar”, afirma Scott. “A empresa teve dificuldades para trabalhar com os clientes de baixa renda.” De fato, os problemas vividos pela construtora começaram em outubro de 2008, com a aquisição da construtora mineira Tenda. Na época, o negócio foi saudado como a oportunidade de a Gafisa ganhar musculatura junto à base da pirâmide de consumo, segmento da população onde se concentra a maior parcela da demanda por novas habitações, turbinada pelos recursos de programas como o “Minha Casa, Minha Vida”. 

 

“Fizemos um movimento estratégico de olho no crescimento da classe C”, afirma Calciolari. “Infelizmente os problemas da Tenda se mostraram maiores do que pensávamos.” Um deles era a falta de padronização dos projetos. Um erro mortal para quem atua em um nicho no qual as margens de ganho são baixas, já que isso impede, por exemplo, a compra de insumos em larga escala e a preços melhores. Hoje, são apenas seis tipos de projetos. Pesou, ainda, a dificuldade da Gafisa em implantar sua cultura de gestão na  Tenda. Para fazer as pazes com os clientes, um contingente que  saltou de 12 mil, em 2005, para os atuais 93 mil, com a incorporação da Tenda e da Alphaville, Calciolari vem atuando em três frentes. Neste ano, serão gastos R$ 27,2 milhões na ampliação dos canais de relacionamento. Além disso, ele contratou especialistas em qualidade, redes sociais e call center. Também adotou o Placar de Atendimento, sistema que mede o grau de resolução das pendências. 

 

 

Problemas em série: Calciolari, presidente, espera zerar a lista de obras em atraso até o final do ano

 

Com isso, Calciolari espera reduzir o nível de reclamações e normalizar o ritmo de entregas, até o final do ano. “Os atrasos entre seis e 12 meses já se tornaram comum no mercado”, afirma Marcelo Tapai, sócio do escritório paulista Tapai Advogados, especialista em direito imobiliário. “Como o mercado está aquecido, muitas empresas prometem entregar o imóvel num período que sabem, de antemão, que não irão cumprir, apenas para fisgar os  clientes.” Levantamento realizado pela Tapai, indica que a Gafisa lidera o ranking de ações na Justiça paulista. Em 2010 foram 481 processos e no primeiro semestre já foram impetradas 255. A direção da construtora reconhece as dificuldades, mas sustenta que o número real de processos é inferior ao apontado por Tapai. O que não deixa de ser uma fonte de desgaste para a imagem da empresa. E uma baita dor de cabeça para os clientes.

 

 

 

 

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